domingo, 21 de setembro de 2014

ESSE É O CARA!

Sainete escrito por Artur Azevedo, em 1906. E continua atualíssimo.

A ESCOLHA DE UM ESPETÁCULO 
(diálogo entre marido e mulher)

MULHER — Fazes-me um favor?
MARIDO — Dize.
MULHER — Leva-nos hoje ao teatro.
MARIDO — Que ideia a tua! Há muito tempo que não vamos a espetáculos! A última peça que vimos foi O Conde de Monte Cristo. Já lá vão dois anos.
MULHER — Não é por mim; é pelas meninas; prometi-lhes que se elas me dessem aquele vestido pronto sexta-feira, eu te pediria que nos levasse domingo ao teatro. Domingo é hoje.
MARIDO — Enfim... Mas a que teatro querem vocês ir?
MULHER — A qualquer. Escolhe tu.
MARIDO — Cá está o Jornal. Vejamos. (Lendo os anúncios do teatro na quarta página.) Procuremos em primeiro lugar o S. Pedro, que é o teatro mais próprio para famílias... Bonito! não há espetáculo no S. Pedro... Vejamos o Lírico... Também não há espetáculo no Lírico.
MULHER — Vê o Apolo.
MARIDO — Também não há espetáculo no Apolo.
MULHER — Vê o S. José.
MARIDO — Também não há espetáculo no S. José.
MULHER — Vê o Lucinda.
MARIDO — Só há matinê.
MULHER — Não gosto de matinês.
MARIDO — Representa-se O Macaco.
MULHER — Também não gosto de macacos.
MARIDO — Só nos resta o Recreio — sim, porque naturalmente não irei levá-la ao Palace-Theatre, nem ao Moulin-Rouge, nem à Maison Moderne...
MULHER — Que há no Recreio?
MARIDO — Dois espetáculos, em matinê e à noite.
MULHER — Já disse que não quero matinê.
MARIDO — Nem eu as levaria a uma peça que se intitula O Homem das Tetas.
MULHER — E qual é a peça da noite?
MARIDO — Adivinha.
MULHER — Dize.
MARIDOO Conde de Monte Cristo!
MULHER — Ora sebo! a mesma que vimos há dois anos!
MARIDO — É o único espetáculo! O melhor é adiarmos a festança... A que estado chegou o teatro no Rio de Janeiro!
MULHER — Pudera! se há tanta gente que faz como nós!...

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